quinta-feira, 27 de maio de 2010
Racismo só existe no atacado?
Frequentemente ouço notícias sobre alguém que teve uma atitude racista e foi indiciado por injúria racial. Ontem mesmo, ao abordar um vereador que conduzia seu carro em alta velocidade e de forma perigosa, um policial negro foi chamado de macaco pelo político. Segundo o delegado, o vereador será indiciado por injúria racial.
Tucanaram o racismo para livrar a cara dos canalhas, costumava pensar com os meus botões. Racismo não é um crime inafiançável, grave?
Resolvi pesquisar e descobri que existe uma diferenciação muito clara entre os crimes de racismo e de injúria racial:
"Há a Injúria Racial quando as ofensas de conteúdo discriminatório são empregadas a pessoa ou pessoas determinadas. Ex.: negro fedorento, judeu safado, baiano vagabundo, alemão azedo, etc.
O crime de Racismo constante do artigo 20 da Lei nº 7.716/89 somente será aplicado quando as ofensas não tenham uma pessoa ou pessoas determinadas, e sim venham a menosprezar determinada raça, cor, etnia, religião ou origem, agredindo um número indeterminado de pessoas. Ex.: negar emprego a judeus numa determinada empresa, impedir acesso de índios a determinado estabelecimento, impedir entrada de negros em um shopping, etc."
Será que eu entendi direito? Chamar um negro de macaco é injúria racial, crime que prevê pena máxima de três anos e que raramente leva à privação da liberdade. Para que o criminoso seja indiciado por racismo, terá de dizer: você e todos os seus irmãos africanos são um bando de macacos! Aí estará sujeito a uma pena de até cinco anos, sem a possibilidade de libertação mediante o pagamento de fiança.
Quer dizer: racismo no varejo é injúria racial, pois só um indivíduo é prejudicado. Para ser considerado delito grave, só se for no atacado.
Grotesco. Felizmente a mesma lógica não se aplica aos homicídios.Já pensou? Matou um só? Entregue 20 cestas básicas. Matou cinco? 30 anos para o psicopata.
quarta-feira, 26 de maio de 2010
Allen
"Minha relação com a morte continua a mesma: sou radicalmente contra".
“Envelhecer é um péssimo negócio. Você não fica mais sábio, nem mais amável, nada. Aconselho vocês a não fazerem isso. É muito melhor ser jovem e conquistar a garota. Vocês não sabem como é frustrante fazer todos esses filmes com Scarlet Johansson e Naomi Watts e não poder beijá-las. Os atores olham pra trás das câmeras e comentam: tá vendo aquele velhinho ali? É o diretor.”
Woody Allen, que está lançando seu novo filme, "You will meet a tall dark stranger", que deve demorar um bocado para chegar a Pindorama - o anterior, o ótimo "Tudo pode dar certo", entrou há pouco tempo em cartaz.
“Envelhecer é um péssimo negócio. Você não fica mais sábio, nem mais amável, nada. Aconselho vocês a não fazerem isso. É muito melhor ser jovem e conquistar a garota. Vocês não sabem como é frustrante fazer todos esses filmes com Scarlet Johansson e Naomi Watts e não poder beijá-las. Os atores olham pra trás das câmeras e comentam: tá vendo aquele velhinho ali? É o diretor.”
Woody Allen, que está lançando seu novo filme, "You will meet a tall dark stranger", que deve demorar um bocado para chegar a Pindorama - o anterior, o ótimo "Tudo pode dar certo", entrou há pouco tempo em cartaz.
Solo
segunda-feira, 24 de maio de 2010
TABACARIA
Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)(15-1-1928 )
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres
Com a morte a pôr umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens.
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira.
Em que hei de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu ,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo.
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando.
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
0 mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num paço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
0 seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena; Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu, que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -,
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei, e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.
Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
0 dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho, Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-te como coisa que eu fizesse
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra, Sempre uma coisa tão inútil como a outra ,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma conseqüência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou á janela.
0 homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(0 Dono da Tabacaria chegou á porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o dono da tabacaria sorriu.
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres
Com a morte a pôr umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens.
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira.
Em que hei de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu ,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo.
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando.
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
0 mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num paço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
0 seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena; Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu, que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -,
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei, e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.
Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
0 dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho, Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-te como coisa que eu fizesse
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra, Sempre uma coisa tão inútil como a outra ,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma conseqüência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou á janela.
0 homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(0 Dono da Tabacaria chegou á porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o dono da tabacaria sorriu.
sexta-feira, 21 de maio de 2010
Procura-se um Günter Wallraff
Günter Wallraff, 67, é um jornalista alemão. Sua especialidade é o jornalismo investigativo e sua estratégia é sensacional. Wallraff se disfarça e mergulha de cabeça nas realidades sombrias que pretende retratar.
Loiro de olhos azuis, já se disfarçou de turco para mostrar as condições aviltantes a que são submetidos os imigrantes turcos na Alemanha. Para isso, trabalhou na construção civil, em minas de carvão, e foi cobaia da indústria farmacêutica. A reportagem lhe rendeu uma infinidade de processos, ameaças de morte, e um livro maravilhoso: "Cabeça de Turco", traduzido em mais de 30 idiomas.
Wallraff também se fez passar por um “yuppie” ambicioso e descolou um emprego no Bild, o jornal mais vendido da Alemanha. Após quatro meses nos bastidores do tablóide, reuniu informações para “Fábrica de Mentiras”, que mostra como o Bild distorce notícias e expõe os menos favorecidos.
Em sua mais recente empreitada, Wallraff se fez passar por funcionário de uma empresa de call center. Estou curiosíssimo para conhecer detalhes da experiência.
E fico pensando: será que não há um Günter Wallraff em Pindorama? Ano após ano as mesmas empresas lideram o ranking de reclamações do Procon - apesar obterem consecutivamente lucros recordes. Já pensaram em um Günter Wallraff no call center de uma empresa de telefonia ou de um banco? Meu deus...
Folha reinventará a imprensa
O Folha alardeia que reinventará a imprensa.
Seu novo projeto gráfico será o feito mais importante desde Gutenberg.
Mas os fiéis leitores do jornal não têm motivos para preocupação. Os princípios éticos da Folha permanecerão intocados, como demonstra o derradeiro artigo publicado ontem pelo economista Paulo Nogueira Batista Jr., diretor-executivo no FMI.
No trecho abaixo, Nogueira explica como foi informado de seu desligamento da equipe de colunistas:
"Telefona-me Raul Juste Lores, que não tive o prazer de conhecer, mas que vem a ser o novo editor do caderno Dinheiro, para informar, de chofre, que a minha coluna deixará de ser publicada pela Folha. Nada de "o gato subiu no telhado" etc. Foi uma execução sumária. Parece que vem aí uma nova turma de colunistas, feroz, antenadíssima com as novas tendências, pronta para escrever sobre temas de vanguarda como tecnologia, linguagem digital, entre outros.
Este é o meu último artigo na coluna. Ora, na minha coluna, os personagens não têm os nomes que têm por mera coincidência ou acaso. Se o novo editor do Dinheiro se chama Juste, isso indica certamente uma inapelável tendência ao equilíbrio e à justiça. Ele me disse com todas as letras (sem intenção de ferir): "A sua coluna é das mais longevas".
Longeva! Senti-me imediatamente como uma múmia, pronta a ser encaminhada para o sarcófago mais próximo."
Os Frias podem deixar o layout das páginas mais bonitinho, mas uma vez Folha, sempre Folha.
Paulo Nogueira e o macartismo da Folha
Seu novo projeto gráfico será o feito mais importante desde Gutenberg.
Mas os fiéis leitores do jornal não têm motivos para preocupação. Os princípios éticos da Folha permanecerão intocados, como demonstra o derradeiro artigo publicado ontem pelo economista Paulo Nogueira Batista Jr., diretor-executivo no FMI.
No trecho abaixo, Nogueira explica como foi informado de seu desligamento da equipe de colunistas:
"Telefona-me Raul Juste Lores, que não tive o prazer de conhecer, mas que vem a ser o novo editor do caderno Dinheiro, para informar, de chofre, que a minha coluna deixará de ser publicada pela Folha. Nada de "o gato subiu no telhado" etc. Foi uma execução sumária. Parece que vem aí uma nova turma de colunistas, feroz, antenadíssima com as novas tendências, pronta para escrever sobre temas de vanguarda como tecnologia, linguagem digital, entre outros.
Este é o meu último artigo na coluna. Ora, na minha coluna, os personagens não têm os nomes que têm por mera coincidência ou acaso. Se o novo editor do Dinheiro se chama Juste, isso indica certamente uma inapelável tendência ao equilíbrio e à justiça. Ele me disse com todas as letras (sem intenção de ferir): "A sua coluna é das mais longevas".
Longeva! Senti-me imediatamente como uma múmia, pronta a ser encaminhada para o sarcófago mais próximo."
Os Frias podem deixar o layout das páginas mais bonitinho, mas uma vez Folha, sempre Folha.
Paulo Nogueira e o macartismo da Folha
quinta-feira, 20 de maio de 2010
Ugo Giorgetti lança "Solo"
Estréia amanhã (21), no Espaço Unibanco Augusta, o longa "Solo", de Ugo Giorgetti (diretor de A Festa, Sábado, Boleiros e O Príncipe, entre outros).
Ao longo de 72 minutos, Abujamra recita um monólogo sobre a solidão e as lembranças dos tempos em que São Paulo era uma cidade agradável de viver. “Tudo está ficando incompreensível”, diz o velho. “A minha é uma solidão como todas as outras.”
"Solo" terá apenas uma sessão por dia, às 18h. Giorgetti acha que assim conseguirá manter o filme em cartaz por mais tempo. O Príncipe, um de seus melhores filmes, ficou poucos dias nos cinemas paulistanos.
Veja trechos do filme 1, 2, 3.
Leia entrevista com Giorgetti
segunda-feira, 17 de maio de 2010
Pausa para o café
O brasileiro já foi o melhor do mundo.
Há alguns anos, o colombiano conquistou a preferência dos americanos.
Mas no mundo dos "chiques", como os classifica a antropóloga Glorinha Kalil, só há lugar para o Kopi Luwak.
Originário da Indonésia, o café mais caro do mundo é produzido artesanalmente. São apenas 230 quilos por ano e o preço para o Sua Majestade o Consumidor é de cerca de mil dólares por quilo.
O processo de produção da iguaria é, digamos, exótico. Os frutos mais doces, maduros e avermelhados do café são ingeridos por civetas, mamíferos semelhantes aos gatos.
Ao passar pelo sistema digestório do animal, o grão sofre um processo de modificação parecido com o utilizado pela indústria cafeeira para remover a polpa do grão de café, mas que envolve bactérias diferentes das usadas pela indústria, além das enzimas digestivas.
De acordo com especialistas, isso faz com que o Kopi Luwak tenha um sabor inigualável.
Isso mesmo. O café mais caro do mundo é produzido a partir das fezes de primos indonésios dos gatos.
Tenho dois gatos e, ao menos duas vezes ao dia, me ocupo da eliminação de seus excrementos - uma tarefa pouco aprazível.
Ao tomar meu próximo cafezinho não deixarei de fazer dois brindes: o primeiro, por não ser rico. O segundo, por não ser tão excêntrico.
Estar na merda não é nada fácil. Agora, pagar caro por ela? Sei não.
sexta-feira, 14 de maio de 2010
Ouro em pó: acervo do jornalista Aloysio Biondi
Após grande empenho da família Biondi, o acervo do grande jornalista Aloysio Biondi pode ser consultado no site http://www.aloysiobiondi.com.br.
Abaixo, trecho de artigo publicado por Biondi na saudosa revista Bundas, no dia 21/12/99. Mais de 10 anos depois, vemos que estamos cada vez mais reféns dos espertalhões.
"O País está sendo literalmente escravizado pelas Cortes. O povo brasileiro está sendo literalmente escravizado para produzir lucros para os povos dos países ricos. Para não ficar nenhuma dúvida sobre esse relacionamento Corte-Colônia: há três semanas, foi instalada na Espanha uma Bolsa de Valores “especial”, anexa à Bolsa de Valores tradicional. Seu objetivo? Ela vai negociar somente ações de empresas energéticas e telefônicas cujo controle foi “comprado” principalmente por espanhóis e portugueses dentro da “privatização”. É um domínio ostensivo, um escarro em nossas caras: nem as ações das empresas “brasileiras” serão mais negociadas nas Bolsas do Brasil. Também, pra que? Escravo não tem dinheiro para comprar ações, mesmo. Pedido ao Congresso Nacional, ou melhor, a Papai Noel: “Queremos nosso Brasil de volta”."
quinta-feira, 13 de maio de 2010
Folha, sempre se superando
O jornal dos Frias tem um caderno chamado "Equilíbrio", cuja linha editorial é o que os descolados gostam de chamar de "viver bem".
No dia 29 de maio de 2008, a reportagem de capa do caderno era sobre odores corporais. Na capa, a ilustração de um negro transpirando, acompanhada do título: chulé, cê-cê, bafo. Saiba a explicação para esses e outros cheiros corporais. No miolo, em página dupla, a ilustração de uma loira envolta em uma nuvem de perfume.
A abordagem era nitidamente racista e os leitores, evidentemente, caíram de pau. O ombudsman da época, o Lins da Silva, chegou a recomendar um pedido de desculpas público, o que não aconteceu.
Quase dois anos depois, nova capa canalha:
" O preço de ser verde - Até que ponto vale a pena investir em um estilo de vida sustentável? Veja, na ponta do lápis, o que é viável para o bolso e o que não passa de ecoviagem.
Saravá! Socorro! Quer dizer que cidadania deve ser avaliada na ponta do lápis? Se for mais baratinho, dane-se o clima, danem-se as florestas, dane-se a água?
Nelson Rodrigues poderia até classificar a equipe do caderno como "idiotas da objetividade". Mas não sejamos tão românticos. É apenas má fé.
Segundo os "especialistas", na ponta do lápis, os jornais impressos não serão mais viáveis. Ah é? Então dane-se a Folha!
quarta-feira, 12 de maio de 2010
Vale viola direitos em 30 países
Fundada em 1942 e privatizada em maio de 1997, a mineradora Vale transformou-se em símbolo da política neoliberal implementada pelo governo Fernando Henrique Cardoso (FHC). A estatal foi adquirida pela iniciativa privada pelo valor de US$ 3,4 bilhões. Atualmente, o valor de mercado passa de US$ 140 bilhões, valor quarenta vezes maior que o preço de sua venda.
Somente no ano de 2009, a Vale teve um lucro líquido de mais de US$ 5 bilhões. Em contrapartida, sua ação exploratória em aproximadamente 30 países em que atua está provocando conflitos sociais e ambientais.
A semelhança das ocorrências nos diversos países onde a Vale atua fez com que 80 organizações, presentes nos cinco continentes, organizassem o Movimento Internacional dos Atingidos pela Vale.
Com a mobilização, foi criado um dossiê, que demonstra a ação devastadora da empresa. O documento foi entregue à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA) no final de março deste ano.
Em entrevista à Radioagência NP, a economista Karina Kato, integrante do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul, defende a anulação do leilão da Vale e fala sobre a tensão social nos territórios atingidos pela multinacional brasileira.
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Somente no ano de 2009, a Vale teve um lucro líquido de mais de US$ 5 bilhões. Em contrapartida, sua ação exploratória em aproximadamente 30 países em que atua está provocando conflitos sociais e ambientais.
A semelhança das ocorrências nos diversos países onde a Vale atua fez com que 80 organizações, presentes nos cinco continentes, organizassem o Movimento Internacional dos Atingidos pela Vale.
Com a mobilização, foi criado um dossiê, que demonstra a ação devastadora da empresa. O documento foi entregue à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA) no final de março deste ano.
Em entrevista à Radioagência NP, a economista Karina Kato, integrante do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul, defende a anulação do leilão da Vale e fala sobre a tensão social nos territórios atingidos pela multinacional brasileira.
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Ney canta "A bela e a fera", de Chico e Edu Lobo
"No bucho do analfabeto
Letras de macarrão
Fazem poema concreto"
Letras de macarrão
Fazem poema concreto"
Imperdível: Tudo pode dar certo, de Woody Allen
Woody Allen conversa com Larry David no set
Sinopse:
O centro da trama é Boris Yellnikoff (Larry David). Separado, suicida frustrado, quase Prêmio Nobel de Física e professor de xadrez para crianças, o homem de meia-idade nutre verdadeiro ódio pela humanidade.
O cético e pessimista divide suas horas entre conversar com amigos pelas ruas de Nova York, sempre disseminando suas teorias sobre o vazio e a ausência de significado da vida, e momentos de completa neurose, como visitas recorrentes a hospitais e os períodos que passa lavando a mão -- que duram o tempo exato de cantar duas vezes "Parabéns a Você".
Sua vida muda, no entanto, quando conhece Melodie (Evan Rachel Wood), uma jovem loira e boba do sul dos Estados Unidos. Em sua inocência, a garota admira a "genialidade" de Boris e logo se apaixona. Não tarda para que os dois se casem, o que gera uma série de encontros e desencontros envolvendo os pais da menina e amigos de Boris.
Sinopse:
O centro da trama é Boris Yellnikoff (Larry David). Separado, suicida frustrado, quase Prêmio Nobel de Física e professor de xadrez para crianças, o homem de meia-idade nutre verdadeiro ódio pela humanidade.
O cético e pessimista divide suas horas entre conversar com amigos pelas ruas de Nova York, sempre disseminando suas teorias sobre o vazio e a ausência de significado da vida, e momentos de completa neurose, como visitas recorrentes a hospitais e os períodos que passa lavando a mão -- que duram o tempo exato de cantar duas vezes "Parabéns a Você".
Sua vida muda, no entanto, quando conhece Melodie (Evan Rachel Wood), uma jovem loira e boba do sul dos Estados Unidos. Em sua inocência, a garota admira a "genialidade" de Boris e logo se apaixona. Não tarda para que os dois se casem, o que gera uma série de encontros e desencontros envolvendo os pais da menina e amigos de Boris.
sexta-feira, 7 de maio de 2010
O minhocão do Maluf e o passarinho do Kassab
Kassab do demo é a alegria das construtoras. Na sua "gestão", pagando uma taxa de "compensação" à Prefeitura, é possível construir qualquer ornitorrinco urbano. Podem ser prédios comerciais e residenciais com dezenas de andares ou aberrações como o shopping Bourbon, que acabou de aniquilar o já difícil trânsito da região da Pompéia - e as compensações no entorno, previstas na aprovação do shopping, ninguém sabe, ninguém viu.
A serviço de seus financiadores, o alcaide acaba de apresentar uma nova invencionice: um plano de revitalização da cidade. A estratégia do prefeito do demo foi engenhosa. Para não deixar evidente que o projeto foi feito sob medida para suas amigas construtoras, a coisa foi anunciada da seguinte forma: "Novo projeto de Kassab prevê o fim do minhocão".
É de tirar o chapéu para os marqueteiros do demo. Poucas coisas são mais odiadas na paulicéia que o minhocão do Maluf. Feio, sujo e malvado.
Só que o minhocão é, como diria o Mário Prata, apenas o passarinho da história. A grande jogada do prefeito do demo é oferecer novos terrenos baratos às construtoras, que já têm dificuldade para encontrar barbadas nas regiões centrais da cidade.
Como se dará a mágica?
Os engenheiros do demo pretendem levar a linha férrea que liga a Lapa ao Brás para as profundezas - especialidade do pessoal do demo -, e criar novas avenidas, repletas de espigões (com alturas infinitamente superiores aos atuais limites).
Sensacional. As empreiteiras também devem estar tendo orgasmos múltiplos - afinal, tudo que é subterrâneo é muito mais caro.
No caso do eixo Lapa- Barra Funda, o projeto também resolve um problema imediato. O barulho dos trens tem diminuído o "potencial mercadológico" dos edifícios (já construídos ou em construção) localizados na avenida Francisco Matarazzo e na rua Guaicurus. Moradores de um conjunto entregue há cerca de três anos, localizado na rua Carlos Vicari, chegaram a pedir que os trens começassem a circular mais tarde para que não perturbassem o sono dos justos.
E o passarinho?
Pois é. Segundo Mário Prata, passarinho é uma coisa que os escritores colocam na história para torná-la mais interessante. É a tal "licença poética". A coisa não aconteceu bem daquele jeito, mas não é que dito dessa forma fica mais legal?
O minhocão do Maluf é o passarinho do Kassab.
De acordo com a prefeitura do demo, com o novo complexo viário ligando a Lapa ao Brás, o minhocão perderia a utilidade e poderia ser demolido. Será?
O minhocão, cujo nome oficial homenageia um dos generais da ditadura, foi inaugurado em 1970 pelo então prefeito biônico Paulo Maluf. Projeto controverso, foi contestado por muitos e desde sempre houve movimentos favoráveis à sua demolição.
No projeto de revitalização do demo, a demolição do "elevado" seria a última etapa. Especialistas ouvidos por um jornal da paulicéia disseram que a demolição se daria em, no mínimo, 15 anos.
Tem ou não tem a maior cara de passarinho? E de farra de tubarões.
A serviço de seus financiadores, o alcaide acaba de apresentar uma nova invencionice: um plano de revitalização da cidade. A estratégia do prefeito do demo foi engenhosa. Para não deixar evidente que o projeto foi feito sob medida para suas amigas construtoras, a coisa foi anunciada da seguinte forma: "Novo projeto de Kassab prevê o fim do minhocão".
É de tirar o chapéu para os marqueteiros do demo. Poucas coisas são mais odiadas na paulicéia que o minhocão do Maluf. Feio, sujo e malvado.
Só que o minhocão é, como diria o Mário Prata, apenas o passarinho da história. A grande jogada do prefeito do demo é oferecer novos terrenos baratos às construtoras, que já têm dificuldade para encontrar barbadas nas regiões centrais da cidade.
Como se dará a mágica?
Os engenheiros do demo pretendem levar a linha férrea que liga a Lapa ao Brás para as profundezas - especialidade do pessoal do demo -, e criar novas avenidas, repletas de espigões (com alturas infinitamente superiores aos atuais limites).
Sensacional. As empreiteiras também devem estar tendo orgasmos múltiplos - afinal, tudo que é subterrâneo é muito mais caro.
No caso do eixo Lapa- Barra Funda, o projeto também resolve um problema imediato. O barulho dos trens tem diminuído o "potencial mercadológico" dos edifícios (já construídos ou em construção) localizados na avenida Francisco Matarazzo e na rua Guaicurus. Moradores de um conjunto entregue há cerca de três anos, localizado na rua Carlos Vicari, chegaram a pedir que os trens começassem a circular mais tarde para que não perturbassem o sono dos justos.
E o passarinho?
Pois é. Segundo Mário Prata, passarinho é uma coisa que os escritores colocam na história para torná-la mais interessante. É a tal "licença poética". A coisa não aconteceu bem daquele jeito, mas não é que dito dessa forma fica mais legal?
O minhocão do Maluf é o passarinho do Kassab.
De acordo com a prefeitura do demo, com o novo complexo viário ligando a Lapa ao Brás, o minhocão perderia a utilidade e poderia ser demolido. Será?
O minhocão, cujo nome oficial homenageia um dos generais da ditadura, foi inaugurado em 1970 pelo então prefeito biônico Paulo Maluf. Projeto controverso, foi contestado por muitos e desde sempre houve movimentos favoráveis à sua demolição.
No projeto de revitalização do demo, a demolição do "elevado" seria a última etapa. Especialistas ouvidos por um jornal da paulicéia disseram que a demolição se daria em, no mínimo, 15 anos.
Tem ou não tem a maior cara de passarinho? E de farra de tubarões.
A verdadeira autoajuda
quinta-feira, 6 de maio de 2010
É a sociedade de consumo, estúpido!
A globalização acaba de nos brindar com mais uma oportunidade de ouro. Após grande sucesso no mundo (Japão, Espanha e Estados Unidos), chega ao submundo a chamada "loja grátis".
O princípio da coisa é o seguinte: empresas como Nestlé, Telefônica -céus, esses espanhóis não perdem a oportunidade de nos brindar com o que há de melhor!-, Locaweb, Plantronics, Góoc e Grupo Berton colocarão nas prateleiras produtos que acabaram de ser desenvolvidos. Então o pato, digo, "Sua Majestade, O Consumidor", escolherá alguns produtos e levará para casa, para testar. Pode ser um alimento, uma bebida, uma roupa, um eletroeletrônico ou absorvente íntimo ou um supositório.
SMOC não pagará nada. Apenas se comprometerá a responder a um questionário, onde apontará defeitos, qualidades, pontos positivos, prós e contras.
"Em vez de investir R$ 60 mil em uma pesquisa de mercado tradicional, o empresário tem um "feedback" dos produtos de uma forma mais barata", diz Luiz Gaeta, sócio da Clube Amostra Grátis, primeira loja do gênero a desembarcar em Pindorama - que será inaugurada no próximo dia 11, na Vila Madalena, em São Paulo.
Convém evitar a região da Vila Madalena no dia 11. VMOC costuma prestigiar as novidades.
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Nova campanha da CNBB: coma um adolescente! Criança é ruim para os negócios.
Segundo o arcebispo de Porto Alegre (RS), dom Dadeus Grings-, "a sociedade atual é pedófila".
Seu colega de trabalho, d. Angélico Sândalo Bernardino, bispo emérito de Blumenau (SC), acha que é preciso distinguir casos de abusos contra crianças de casos de abusos contra adolescentes.
Para Angélico, há uma confusão generalizada entre pedofilia e efebofilia (atração sexual por adolescentes)."Tocar numa criança é diferente de tocar num adolescente. E essa distinção comumente não é feita".
Ah, bom. Em breve o Bento deve soltar uma encíclica com diretrizes claras: tá com desejo sexual, estupra um maior de 12 anos. Mas vê se não mata, heim?!!
Seu colega de trabalho, d. Angélico Sândalo Bernardino, bispo emérito de Blumenau (SC), acha que é preciso distinguir casos de abusos contra crianças de casos de abusos contra adolescentes.
Para Angélico, há uma confusão generalizada entre pedofilia e efebofilia (atração sexual por adolescentes)."Tocar numa criança é diferente de tocar num adolescente. E essa distinção comumente não é feita".
Ah, bom. Em breve o Bento deve soltar uma encíclica com diretrizes claras: tá com desejo sexual, estupra um maior de 12 anos. Mas vê se não mata, heim?!!
terça-feira, 4 de maio de 2010
Cosme e Damião
O texto a seguir, intitulado "A Pirâmide do Cosme Velho", foi escrito pelo jornalista Marco Aurélio Melo:
"Na base uma estrutura enorme, com ramificações na produção de diversos tipos de conteúdo: informação, entretenimento, teatro, música, cinema, editoração, preservação da memória e projetos de cunho sócioambiental. Tudo parece lindo, mágico, cheio de pessoas bem intencionadas, lutando por causas nobres. Mas por trás do negócio está a lógica perversa, amparada em patrimônio adquirido na base da usurpação, da fraude e da chantagem política. E com meios produção forjados à custa de investimentos estrangeiros ilegais, contrabando e corrupção.
Na faixa intermediária é onde estão os mecanismos de controle da produção intelectual. Uma estrutura hierárquica grandiosa lenta e burocrática, repleta de instâncias de decisão, onde lacaios e vassalos se acomodam e exercem seu pequeno poder absolutista, despóticamente. Aspiram o sucesso a qualque custo, considerando que ele seja um caminho natural, desde que as ordens do alto sejam cumpridas, preferencialmente sem questionamentos ou constrangimentos, que possam abalar os interesses "maiores" da corporação.
No topo está a ideologia, o conjunto de valores a serem presevados. A propriedade extensa e centralizada, os recursos econômicos abundantes e livres, para circular sem amarras e sem tributos, os direitos autorais e de reprodução controlados e novos formatos, tecnologias e estratégias sujeitos à aprovação por uma instância decisória fechada.
Para dar dimensão expetacular ao negócio, uma rede de pequenos "sócios" ou "parceiros". Quem ousar enfrentar o oligopólio está sujeito à censura ou à lei, quase sempre escrita pelos seus. Como desmontar essa lógica que se funde às instituições e forja um Estado frágil, injusto e desigual? Eis a questão."
Comentário:O jornalista se refere à Rede Globo. Concordo com ele. O império platinado foi construído com base na usurpação, na fraude e na chantagem política. Só tem um problema: hoje, Mello oferece sua força de trabalho à Rede Record, comprada e mantida com o dinheiro da Igreja Universal. Também sou ressentido em relação a um antigo empregador. Aquele que não for, que atire a primeira pedra. Mas é preciso haver um mínimo de coerência, cara pálida.
"Na base uma estrutura enorme, com ramificações na produção de diversos tipos de conteúdo: informação, entretenimento, teatro, música, cinema, editoração, preservação da memória e projetos de cunho sócioambiental. Tudo parece lindo, mágico, cheio de pessoas bem intencionadas, lutando por causas nobres. Mas por trás do negócio está a lógica perversa, amparada em patrimônio adquirido na base da usurpação, da fraude e da chantagem política. E com meios produção forjados à custa de investimentos estrangeiros ilegais, contrabando e corrupção.
Na faixa intermediária é onde estão os mecanismos de controle da produção intelectual. Uma estrutura hierárquica grandiosa lenta e burocrática, repleta de instâncias de decisão, onde lacaios e vassalos se acomodam e exercem seu pequeno poder absolutista, despóticamente. Aspiram o sucesso a qualque custo, considerando que ele seja um caminho natural, desde que as ordens do alto sejam cumpridas, preferencialmente sem questionamentos ou constrangimentos, que possam abalar os interesses "maiores" da corporação.
No topo está a ideologia, o conjunto de valores a serem presevados. A propriedade extensa e centralizada, os recursos econômicos abundantes e livres, para circular sem amarras e sem tributos, os direitos autorais e de reprodução controlados e novos formatos, tecnologias e estratégias sujeitos à aprovação por uma instância decisória fechada.
Para dar dimensão expetacular ao negócio, uma rede de pequenos "sócios" ou "parceiros". Quem ousar enfrentar o oligopólio está sujeito à censura ou à lei, quase sempre escrita pelos seus. Como desmontar essa lógica que se funde às instituições e forja um Estado frágil, injusto e desigual? Eis a questão."
Comentário:O jornalista se refere à Rede Globo. Concordo com ele. O império platinado foi construído com base na usurpação, na fraude e na chantagem política. Só tem um problema: hoje, Mello oferece sua força de trabalho à Rede Record, comprada e mantida com o dinheiro da Igreja Universal. Também sou ressentido em relação a um antigo empregador. Aquele que não for, que atire a primeira pedra. Mas é preciso haver um mínimo de coerência, cara pálida.
A ordem dos fatores não altera o resultado
Na China, ainda chamada por muitos de comunista, o acelerado e contínuo crescimento econômico tem gerado uma explosão no mercado imobiliário. Resultado: os preços dispararam. Em apenas um ano, imóveis em Xangai tiveram uma valorização de 52%. Em Pequim, de 42%. Em Hong Kong de 40,5%.
Os brilhantes empreendedores só se esqueceram de um detalhe. A renda do povo chinês não aumentou na mesma proporção. Mas a solução veio rápido. No bairro de Liulangzhuang, norte de Pequim, foi inaugurado um complexo de "apartamentos-formiga", com apenas 2 m2 cada um - como o da foto acima.
Todos os cubículos foram alugados pouco depois de estarem prontos, em meados do mês passado. Um dos inquilinos é o animador gráfico Jia Tan Sheng Jin, 24. Recém-chegado da Província de Jiangsu (leste), ele pagou mil yuans (R$ 252) por três meses, o equivalente a cerca de 10% de sua renda nesse período.
Por outro lado...
O Japão, por outro lado, é um país capitalista. Confesso que fiquei confuso quando morei em Tóquio no século passado, entre 1997 e 1998. Todos pareciam ter uma vida de classe média - ao contrário de Cuba, que como sempre dizem as Hebes e Mainairdis da vida, socializou a pobreza.
Eis que, pouco mais de uma década depois, vê-se que a coisa não é bem assim. Antes dos vizinhos chineses os japoneses já tinham se obrigado a morar em cubículos - meu apartamento em Tóquio tinha 16 m2. Mas agora, segundo revelou o Ministério do Trabalho,1 em cada 6 japoneses (ou 20 milhões de pessoas) vivia na pobreza em 2007. Segundo a Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento, o índice de pobreza do país, de 15,7%, está próximo aos dos Estados Unidos (17,1%), cujas desigualdades sociais há muito são vistas com desprezo e pena pelos japoneses.
Pesquisadores estimam que o índice de pobreza no Japão tenha duplicado desde o colapso dos mercados imobiliário e financeiro do país no início dos anos 90, que provocou duas décadas de estagnação e declínio da renda.
Tão diferentes, apesar de fisicamente semelhantes, chineses e japoneses trilharam caminhos totalmente diferentes - será mesmo? - e acabaram na mesma encruzilhada.
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