segunda-feira, 13 de abril de 2009

Afinal, pra quê serve um "sambista de raiz"?



No último sábado assisti ao show de um grupo vocal carioca, o Arranco de Varsóvia. Além da promessa de um repertório pontuado por ótimo samba de raiz, fui seduzido pela participação mais do que especial do grande Nelson Sargento.

O show foi delicioso e a participação do Nelson comovente, sobretudo quando ele pediu que o "respeitável público" comprasse o seu disco no saguão, pois as coisas andavam difíceis. "Dizem que o disco é independente, mas na verdade ele me torna dependente de um monte de gente", acrescentou o representante maior da Velha Guarda da Mangueira.

O apelo do Sargento me assombrou. Como é que um cara desse naipe, com tão respeitável folha de serviços prestados à música brasileira, precisa ficar fazendo participações especiais em shows e mascateando discos para faturar alguns trocados?

A triste explicação encontrei no encarte do belo CD que comprei na saída, em um texto de outro bamba, Nei Lopes, que reproduzo parcialmente:

"Afinal, pra quê serve um "sambista de raiz"?
Esta pergunta nós nos fizemos, num misto de tristeza e indignação, quando vimos o parceiro Wilson Moreira cair vítima de um derrame, cerca de onze anos atrás.
Naquele momento a garota, filha daquela rapaziada universitária que se extasiou com a modernidade afro de Clementina no Teatro Jovem e elevou o velho Zicartola à categoria de templo maior do samba carioca, começava a descobrir os finos petiscos de Cartola, Candeia e companhia. E, aí, nós, aporrinhados da vida, chamamos para nós mesmos a responsabilidade da resposta.
No nosso modesto entender - pensamos -, um sambista de verdade ("de raiz" é rótulo maroto) serve como ponte entre o ontem e o amanhã; como referencial e também como baluarte - no sentido do "suporte, apoio, sustentáculo" e também no de "fortaleza inexpugnável" contra as investidas destruidoras.
Agora - perguntávamos novamente, para logo depois voltarmos a responder -: quanto vale um sambista nessa história?
Em termos de mercado, sabemos, por experiência própria, que vale muito pouco. Porque os assim chamados, principalmente os rotulados como "de raiz", são sempre aqueles que, embora reverenciados e com boa entrada na tal da "mídia", quase nunca são gravados pelos grandes vendedores de discos; quase sempre são convidados "especiais" só para cantar de graça ou para receber o "simbólico", o "da passagem"; e nunca, apesar das placas-de-prata e medalhas de mérito, são incluídos no contexto da milionária indústria cultural".

Nei Lopes, junho de 2008

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